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Capítulo 4 A história como ciência:
o historicismo alemão, a escola metódica francesa e a história quantitativa anglo-saxã.

Escola rankeana ou escolas histórica alemãs?

Não foram poucos os historiadores e teóricos da história que defenderam que a Escola Rankeana teria sido a primeira escola histórica, também confundida como histórica alemã. Ou ainda de que ela seria uma história positivista que acreditava na possibilidade de produzir uma história objetiva, fundamentada na crítica dos testemunhos, a fim de estabelecer a verdade sobre o passado. Mas, para dissipar esses mal-entendidos, é preciso considerarmos o nascimento do método histórico e o modo como a defesa de uma história científica foi decisiva na Alemanha e na França do século 19.

Como durante muito tempo a história foi vista como um gênero literário, um tipo de estudo desinteressado e sem um corpus analítico específico, era muito comum ou a imitação dos estilos dos antigos, baseada na referência aos autores clássicos da historiografia antiga ou moderna. A emergência, durante os séculos 17 e 18, de uma história filosófica escrita por filósofos igualmente produzia interpretações mais gerais sobre o passado, sem o recurso à comprovação empírica ou documental. Somente na segunda metade do século 18 é que a crítica e a desconfiança dos textos históricos existentes fizeram com que emergisse uma metodologia específica para a história. De um modo geral, essa metodologia correspondeu à constituição da crítica documental. E, para isso, foram decisivas tanto a diplomática quanto a filologia e a hermenêutica – ou seja, técnicas de classificação, reconhecimento e análise dos textos e documentos históricos, para verificar sua autenticidade, procedência, autoria e destinação, ao lado da análise de seu conteúdo. Um aparato técnico e crítico secularmente desenvolvido desde a Antiguidade até o século 18.

No século 19 esse aparato associou-se a uma atmosfera específica no campo dos saberes, a cientificização. Isto é, os saberes, durante o século 19, começaram a ser vistos como autônomos e, consequentemente, científicos. Não por acaso, do corpus existente dos saberes mais tradicionais, como a filosofia, o direito, a literatura, a engenharia ou a medicina, por exemplo, surgiram novos saberes, como a geografia, a antropologia, a psicologia ou a história. Todos esses saberes deveriam reivindicar para si um objeto e uma metodologia específicos. É nesse sentido que filologia, a diplomática e a hermenêutica se converteram em método histórico; em outras palavras, em crítica documental. Além disso, os historiadores precisaram desenvolver uma teoria específica para a história.

Na Alemanha esse percurso é esclarecedor. Em 1752 Chladenius fez a crítica da história produzida até então. Para ele era necessário estabelecer um método e um conhecimento (Wissenchaft) específico e novo, capaz de elucidar o caráter histórico de todos os saberes e coisas. Esse método estaria fundamentado na compreensão e análise dos diferentes pontos de vista produzidos a respeito do objeto investigado. Ou seja, para Chladenius a história era uma matriz para todos os saberes, pois o caráter histórico era o fundamento natural e necessário de todas as coisas, inclusive os próprios saberes. E como existem diferentes testemunhos sobre os saberes e as coisas, a história precisa se tornar um corpus analítico seguro para se produzir e difundir todo o conhecimento. Se tudo é histórico, a história se converte na mãe de todos os saberes, e não mais a filosofia. Baseado tanto na filosofia de Leibniz43 quanto na hermenêutica romântica, Chladenius é um dos precursores da teoria da história moderna. Ao mesmo tempo, na França, a figura de Voltaire se destaca ao propor um novo tipo de escrita da história, tal como aparece no verbete história que produziu para a Enciclopédia de Diderot e D´Alembert e em seu livro Ensaio sobre os costumes. Para Voltaire a história precisa deixar de ser uma crônica de reis e batalhas para se tornar um conhecimento crítico que, entre outras coisas, deve levar em conta a cultura específica de cada civilização.

Fotografia em preto e branco em uma moldura oval com ornamentos de folhas. Homem de meia idade, cabelo cacheado até os ombros. Usa uma toga de corte preta. O retrato está em cima de um tecido e na parte inferior há um texto.
FIGURA 1: Chladenius
Fotografia preta e branca. Retrato em uma moldura oval. Busto de homem adulto, cabelo liso, curto. Usa blusa branca de gola alta por baixo de um casaco. Na parte inferior há um retângulo escrito “Dr.Fr. Schleiermancher”.
FIGURA 2: Friedrich Daniel Ernst Schleiermacher

O caminho aberto por Chladenius aperfeiçoou-se ainda mais com o desenvolvimento da hermenêutica de Schlaiermacher, amigo e contemporâneo do futuro pai da historiografia moderna: Leopold von Ranke. Enquanto, por um lado, Chladenius insistia na historicidade dos homens, das coisas e dos saberes, por outro, Schlaiermacher aperfeiçoou a compreensão como um fundamento metodológico para as ciências históricas ou humanas. Schlaiermacher propôs o círculo hermenêutico como um ponto de partida obrigatório: as partes iluminam o todo e o todo ilumina as partes. Ou seja, os fragmentos expressam um determinado contexto ou estrutura e esta ilumina as partes ou vestígios. E esta é uma regra pétrea que ainda hoje é decisiva não somente na história como em muitas outras ciências, a chamada contextualização.

Ensejaram-se o nascimento de “regimes de cientificidade” – na recusa dos modelos de causa-efeito do passado –, a revolução na crítica dos testemunhos e a busca por novas evidências empíricas ocorrida com a organização e a conulta de arquivos e documentos até então reservados.44 O aperfeiçoamento da crítica documental alemã avançou ainda mais com Barthold Niebuhr (1776-1831) e Johann Droysen (1808-1884), quando desenvolveram o método histórico compreensivo.45 O cuidado maior nesse trabalho de crítica e interpretação residiria, sobretudo, no combate aos anacronismos e na ênfase sobre a compreensão do passado, que não mais serviria para entender o presente ou mesmo para oferecer modelos à atualidade. Em suas perspectivas historicistas, Niebuhr e Droysen insistiram nas diferenças havidas entre os homens do passado e do presente.46 Seguindo essa nova trilha então aberta nos campos da história, verificou-se o desenvolvimento de uma história científica, campo autônomo do saber, apartado dos estudos filosóficos ou literários. E, pari passu, o encolhimento do uso e do apreço pelas formas da historia magistra vitae. Elas provocariam um divórcio mais amigável entre a história e a literatura, já que os historiadores alemães não abandonaram as dimensões poética e narrativa em seus escritos. Reconheciam a cicatriz literária de origem das narrativas históricas.

Observe-se as reivindicações de Leopold von Ranke (1795- 1886) ou as demandas feitas por Wilhelm von Humboldt (1767- 1835).47 Para ambos, a história seria ciência e arte a um só tempo. Note-se ainda a presença da narrativa nos estudos de Droysen (1808-1884) ou no manual de Ernst Bernheim (1850-1942).48

Na França, por exemplo, o rompimento entre ambas as dimensões foi bem mais categórico. E não constitui novidade o interdito lançado pelos historiadores franceses oitocentistas aos excessos literários e filosóficos presentes nos textos históricos, sobretudo pelos denominados metódicos. Mesmo para os historiadores românticos do século XIX, a história não poderia ressentir-se da base empírica como fundamento, ainda que mantivessem o apreço pelo estilo e pela eloquência em suas narrativas.

Voltemos um pouco mais a duas figuras fundamentais para o nascimento da ciência histórica alemã: Barthold Niebuhr e Wilhelm von Humboldt. O primeiro, ao publicar sua História romana em 1811-1812, corrigiu uma compreensão errônea dos antigos romanos, marcada pelo anacronismo, ou seja, a compreensão que construía uma imagem ou uma interpretação dos romanos segundo o julgamento ou a moral contemporânea. Uma interpretação marcada por subjetividade, preconceitos e juízos de valor que comparava o passado ao presente, quando não pintava aquele conforme o bel-prazer do historiador. Para Niebuhr os romanos eram retratados como se fossem alemães do final do século 18 e início do 19. Sem dúvida, o boom de novas traduções que vinham sendo feitas na Alemanha de autores clássicos da antiguidade foi de uma enorme contribuição para essa reelaboração crítica dos romanos ou gregos. Assim, Homero, Tucídides, mas também Ésquilo ou Aristóteles foram novamente traduzidos para o alemão, dessa vez, diretamente do original e não de traduções latinas posteriores.

Humboldt, por sua vez, teve papel decisivo na gênese do que viria a ser o historicismo alemão. Na seara aberta por Chladenius, mas também seguindo os passos do filósofo Herder em sua preocupação com a singularidade e a linguagem, Humboldt redige, em 1821, sua famosa conferência A tarefa dos historiadores para a Universidade de Berlim. Nela, ele afirmou que a tarefa do historiador é apresentar uma narrativa que é o resultado de uma pesquisa histórica que analisa os nexos e as forças históricas que atuaram ara produzir os fatos ou as formas históricas. Poliglota e cosmopolita, Humboldt defendia cada história como o resultado particular de um povo ou cultura. Desse modo, afasta-se das histórias universais filosóficas e defende histórias particulares de povos ou nações. Ele considerou ainda que toda história possui objetividade e subjetividade, por depender da intuição, da imaginação e da invenção que nasce na cabeça dos historiadores. Idealista, Humboldt reivindicava a busca do nexo como um fundamento supra- -histórico e criticava as formas tradicionais que eram mobilizadas para promover a explicação histórica: a mecanicista, a evolucionista e a psicológica.49

Foi sob a influência desses dois pensadores que emergiu a figura emblemática e poderosa de Ranke, ainda hoje cercada de mal-entendidos e estereótipos. Esse, que foi um dos maiores historiadores de todos os tempos, desenvolveu uma nova maneira de produzir e de ensinar história. A rigor, ele enfatizava a necessidade pela busca e confrontação dos testemunhos a fim de se obter uma história mais crítica e objetiva e menos baseada em julgamentos morais ou políticos. Também reivindicava o apartidarismo do historiador; ele não defendia a neutralidade, mas sim que o historiador não tomasse um partido, não escrevendo a história somente sob a perspectiva de uma determinada posição ou grupo. Incorporado à Universidade de Berlim a convite de Humboldt, Ranke escreveu uma obra monumental, hoje reunida em 60 volumes na Alemanha. Cosmopolita, pesquisador incansável e inventor do modelo do seminário acadêmico, Ranke foi um defensor e divulgador do que chamou de ciência histórica. Segundo ele, os alemães produziam uma nova história e esse modo original de escrever a história alcançou imediata recepção em diferentes países. Não foram poucos aqueles que, desejando se tornar historiadores, fício que necessariamente nasceu entre os alemães, foram estudar nas universidades de Berlim, Goettingen ou Heidelberg com mestres que colaboraram na profissionalização do campo. Muitos futuros historiadores importantes estudaram algum tempo na Alemanha, ingleses, italianos, espanhóis, franceses e até americanos. Igualmente, as obras alemãs eram rapidamente traduzidas para esses idiomas difundindo a ciência histórica alemã.50

Críticos da história filosófica, naquela altura praticada por Hegel e seus discípulos, ou da história romântica como um gênero literário, produzida por não especialistas, ou do mero idealismo filosófico que desconsiderava a empiria dos fatos e dos testemunhos, a escola histórica alemã foi responsável pela autonomização do campo em face da literatura e da filosofia, situando a história como um saber maior, idiográfico, visto que partia do estudo de singularidades históricas fundamentadas no método compreensivo e não de uma ciência explicativa nos moldes das ciências exatas ou naturais, que estudavam regularidades baseadas em leis mais gerais nas quais objeto e sujeito do conhecimento são diferentes.

Pintura colorida. Homem de maia idade, cabelo curto branco, bochecha rosada. Usa uma blusa de gola alta branca de baixo de um terno preto e um casaco preto, do lado esquerdo do seu terno há uma medalha quadrada e em seu pescoço um medalhão redondo.
FIGURA 3: Leopold von Ranke

O acabamento a esse modo de pensar, pesquisar e produzir história seria dado com a obra Historik, de Johann G. Droysen, em 1857. Esse historiador devotado ao estudo da história grega, que cunhou o conceito de helenismo, e da história alemã desenvolveu um primeiro curso de teoria da história em Iena, e que levou para a Universidade de Berlim. Nesse contexto, conferiu maior acabamento ao estatuto epistemológico e delimitou as etapas e o método específico da história. Para Droysen, a história seria a ética da humanidade, seu autoconhecimento, e estudá-la seria um exercício dialógico de compreensão das comunidades éticas e suas relações.51

A recepção do grupo alemão no exterior foi sempre controversa, de maneira geral. Embora admirados por tentar fazer da história uma ciência, não raro eram vistos como germanófilos, nacionalistas, positivistas, reacionários, demasiadamente metafísicos e conservadores. Seu espólio, contudo, tem sido reavaliado positivamente, deixando-se de lado o julgamento ideológico que os relegara ao ostracismo, ao mesmo tempo em que foram sobrepujados pela influência historiográfica francesa. Os historiadores prussianos foram críticos da universalidade iluminista, embora conservassem o otimismo em relação ao futuro. Partidários do pensamento historicista, enfatizavam as singularidades históricas.

Contudo, cabe considerar que reduzir a historiografia alemã do século XIX à rubrica de rankeana, como se todos os historiadores concordassem com ou adotassem o modelo de Ranke, utilizado na Universidade de Berlim, é algo que merece cuidado. Das duas orientações fundamentais da historiografia alemã existentes no início do século 18, relacionadas tanto com a escola e a tradição filológica de Göttingen, em torno de Wolf, Böckh ou Müller, quanto com a escola romântica de Iena capitaneada por nomes como os de Goethe, Fichte, Schiller ou Novalis, surgiriam novas correntes de filósofos ou filólogos que se convertem efetivamente em historiadores. Assim, teríamos o surgimento de algumas escolas históricas contemporâneas, que defendiam a autonomia do campo, bem como preconizavam a compreensão científica desse saber: a escola rankeana, que era a maior e a mais numerosa; a escola histórico-jurídica de Savigny e Mommsen; a escola histórica prussiana vinculada ao grupo de Droysen e Sybel, em torno da Revista Histórica criada em 1859; a escola histórico-política de Heidelberg, liderada por Carl Rotteck; a escola sociocultural de Karl Lamprecht em Leipzig; e, por fim, a escola histórico-econômica de Tübingen, de Gustav Schmoller, que, entre outros, influenciará Max Weber. Cada escola contava com especificidade, convergindo apenas na defesa do historicismo, na recusa do iluminismo francês, no reconhecimento da subjetividade do historiador na pesquisa histórica, na defesa de um estudo objetivamente conduzido.52

Outra questão que merece atenção é a afirmação de que Ranke ou os historiadores alemães fossem positivistas. Ranke, por exemplo, definiu seu método e suas diretrizes teóricas em 1824, quando publicou seu primeiro e mais importante trabalho: História dos povos latinos e teutônicos de 1494 a 1514. Nele está o capítulo Sobre a crítica dos novos historiadores, em que indica o seu horizonte intelectual, que se tornaria uma das bases do historicismo alemão: cada história é singular, única e irrepetível, e jamais será conhecida em sua plenitude. Algumas forças históricas podem até ser reconhecidas, mas toda a história não. Seu diálogo é com a hermenêutica filosófica alemã, com Herder e Leibniz, com Humboldt, não com o pensamento francês. Em 1842 Comte concluiu a publicação de seu Curso de filosofia positiva, cuja escrita foi iniciada em 1830. Em outras palavras, Ranke não poderia ser positivista antes mesmo de o positivismo ter nascido.

A escola metódica francesa

A escola metódica francesa inicia-se na segunda metade do século XIX e vai até meados de 1930. Ela é uma reação à história romântica de Michelet, Thiers e Guizot. Representa uma defesa do princípio republicano e liberal. Tem seu ano-chave em 1876, quando Monod e Fagniez fundam a Revue Historique.

Entre suas principais características destacam-se: a defesa de história científica, nacionalista e protestante e o compromisso com a verdade dos fatos. É imperativo dissociar a chamada Escola Metódica do Positivismo ou da filosofia positiva de Auguste Comte.53 Contudo, erroneamente encontramos a Escola Metódica sendo chamada de Escola Positivista, quando na verdade os pressupostos da filosofia positiva de Comte não serviram de referência para o principal grupo de historiadores franceses metódicos, que tinham como rivais os representantes da historiografia romântica como Jules Michelet ou François Guizot. Ao contrário dos românticos, os metódicos expressam a confiança de uma época na ciência, na objetividade, na razão, algo bastante comum naquele período. Mas, diferentemente de Comte, não defendem a evolução histórica como a passagem pelos três estágios (sobrenatural, metafísico e positivo).54 Partilham da ideia de que o objeto e o sujeito do conhecimento não se confundem, de que os fatos históricos são objetivos e dados, mas reconheciam a necessidade da análise, da eleção e da exposição desses fatos. O termo positivista, usado pejorativamente por alguns críticos de Gabriel Monod e seus colegas da Sorbonne ou do Collége de France foi usado no final do século 19 e início do 20 de maneira anacrônica e reducionista. A filosofia positiva pouco influenciou a história, salvo no caso de historiadores como Louis Halphen, Louis Bourdeau e Paul Lacombe, que confessadamente se intitulavam seguidores de Comte. Mas os três não integravam o grupo de Monod.55

Fotografia preta e branca. Busto de homem de meia idade, cabelo ondulado, curto e barba média. Usa um óculos oval de metal e veste uma camisa social branca, terno e gravata.
FIGURA 4: Gabriel Monod

Por pressupor uma neutralidade axiológica, algo manifestado no interesse de alguns historiadores ao redigir a história, talvez tenha se originado essa errônea interpretação acerca dos metódicos. Contudo, aspectos fundamentais do positivismo, como a noção de que a humanidade segue leis naturais necessárias de evolução independentes da ação humana e que a metodologia empregada para conhecer essa evolução é objetiva e semelhante à das ciências naturais, distanciam essas duas correntes de pensamento. Portanto, seria difícil sustentar a existência de uma história positivista. Primeiro, porque boa parte daqueles historiadores descreviam a história tal como comprovada pela documentação consultada; logo, procuravam evitar que sua subjetividade interferisse no resultado final, sem fazer apologia de uma neutralidade.56 Segundo, porque já no início do século XX a presença do historicismo, particularmente na Alemanha, refutava um desenvolvimento linear ou necessário para todas as sociedades existentes. Terceiro, porque esse mesmo historicismo reivindicava para a história um método específico, bastante distinto do modelo adotado pelas ciências físicas ou naturais. Vale lembrar que a forte presença da política, das decisões políticas sobre a história inviabilizariam qualquer proposta de uma ação histórica independente da vontade humana, já que o curso dos acontecimentos poderia ser alterado pela política.

Obra decisiva que marca o posicionamento do grupo em relação ao método é Introdução aos estudos históricos, de Langlois e Seignobos, publicada em 1898, um manual que teve grande acolhida entre os metódicos e se tornou referência para os historiadores. A Escola Metódica privilegia os fatos políticos, as datas-limites, o factual na história, os grandes personagens. Faz uma história nacionalista e comprometida com a versão francesa. Ela ficou também conhecida como velha história ou como história conservadora. Seus representantes eram todos vinculados ao Estado francês. Autoproclamando-se como científica, objetiva e antifilosófica, seus grandes méritos foram o desenvolvimento da crítica documental e a defesa para que os historiadores buscassem as fontes para melhor investigar o passado.

As críticas que fizeram à Escola Romântica se devem à aversão ao catolicismo e à idealização do passado, no qual a Igreja se fazia muito presente. Igualmente viam com reservas o recurso às figuras literárias, à narrativa. Pensavam que a reprodução dos fatos conferia maior cientificidade à história. Por isso, valorizaram demasiadamente as fontes escritas, pensando encontrar ali uma expressão verdadeira do passado. Descartavam a interpretação e a compreensão, a fim de marcar seu distanciamento em relação aos românticos e aos alemães. A debilidade maior dos trabalhos do grupo reside em sua neutralidade impraticada e em sua crença em um realismo epistemológico, no qual a verdade estaria localizada nos documentos, que seriam evidências concretas do passado (BOURDÉ; MARTIN, 1994, p. 100).

O programa da Escola Metódica na França pode ser localizado em dois textos: no manifesto escrito por Gabriel Monod no primeiro número da Revista Histórica, lançada em 1876, e no manual de Langlois e Seignobos publicado em 1898.57 Afastando-se de especulações filosóficas, de procedimentos literários e buscando maior cientificidade, com uma maior objetividade por parte dos historiadores, os metódicos difundiram uma forma de se pensar e produzir a história. Coube a eles o aperfeiçoamento de técnicas para a reconstrução histórica e de modelos de análise, difundidos em manuais, nas escolas e nas Universidades. Os historiadores metódicos, na França, participaram da reforma do ensino superior e ocuparam cátedras em novas universidades, redigindo grandes coleções de história nacional e história geral. Redigiram ainda manuais escolares – os livros didáticos – que seriam utilizados por gerações, enaltecendo a república e levantando censuras à Igreja católica ou à sua importância histórica para a nação francesa. O predomínio desse tipo de interpretação histórica perdurou até meados da Segunda Guerra Mundial.

O principal veículo da Escola Metódica foi A Revista Histórica, fundada em 1876 por Monod e G. Fagniez. Do total de 53 colaboradores, 31 eram professores do Collège de France, da École de Hautes Études e das faculdades de letras, e 19 eram arquivistas e bibliotecários. O intercâmbio deixa claro o interesse do grupo. O período histórico ao qual se dedicaram vai da morte de Teodósio (395) até a queda de Napoleão I (1815). Constituíram o grupo duas gerações. A primeira, com Duruy, Renan, Taine, Coulanges; e a segunda, com Monod, Lavisse, Rambaud, entre outros. A Revista Histórica foi lançada para combater a Revista de Questões Históricas, de 1866, formada por aristocratas e simpatizantes do Antigo Regime, que tinha um gosto pela erudição, pela exaltação da Igreja católica e pela monarquia. Na revista de Monod, predominavam protestantes, sendo raros os católicos. Monod deixa bem claro de onde provinha a influência sobre essa nova maneira de se pensar a História: a Alemanha. Em suas palavras:

Foi a Alemanha que contribuiu com a mais forte parte para o trabalho histórico do nosso século [...]. Publicação de textos, crítica das fontes, elucidação paciente de todas as partes da história examinadas uma a uma e sob todas as faces, nada foi desprezado [...] (BOURDÉ; MARTIN, 1994, p. 99).

Entre os grandes nomes dessa historiografia germânica estão Von Ranke, Mommsen, Eichhorn, Waitz, Pertz e Gervinus. Entre as produções do grupo, destaque-se a recompilação de fôlego da Monumenta Germmaniae Historica. Monod tomou contato com toda essa produção quando foi professor em universidades do além-Reno.

De certa maneira, todos os metódicos se inseriam numa rede, tendo à frente Monod, mas também Ernest Lavisse com sua História da França, bem como Langlois e Seignobos, que naquela altura eram professores na Sorbonne. Pode-se dizer que esses historiadores realizaram uma verdadeira ruptura epistemológica com o providencialismo cristão, com o progressismo racionalista e o finalismo marxista (BOURDÉ; MARTIN, 1994, p. 102). Intitulando-se como neutros e imparciais, os metódicos franceses defendiam uma cientificidade na escrita da história. Para os metódicos, a história é mudança e os eventos marcantes são aqueles determinados pela política.

Langlois e Seignobos se inspiram na teoria do reflexo de Von Ranke, formulando a ideia de que a história não passa de uma aplicação de documentos. Documentos são pensamentos ou vestígios dos atos humanos, com valorização daqueles mais palpáveis, como decretos, cartas, correspondências, manuscritos e vestígios arqueológicos. Ir aos arquivos – a isso correspondia fazer história. Àquela altura, havia na França um grande empenho para a descrição e catalogação das fontes disponíveis. Evidência disso é a publicação dos catálogos dos Arquivos Nacionais, da Biblioteca Nacional, e os ficheiros dos Arquivos Departamentais.

Notas proêmias: Fotografia do livro francês Estudos Históricos de Langlois e Seignobos de 1965. Capa de livro em formato retangular com fundo alaranjado. De cima para baixo, estão dispostos de forma alinhada ao centro, na cor preta e com diferentes tamanhos de fonte, os seguintes textos: 1 - Introduction. 2 - Aux. 3 -Études Historiques. 4 - par. 5 - CH. - V. Langlois, CH. Seignobos. 6 - cinquième Edition.  5 - lParis. 6 - Libbrarie Hachette et Cie. 7 -79, Bouvelard saint-germain, 79. 8 - Dreuits de tradutions at de reprodution rèservès.
FIGURA 5: Primeira edição francesa do livro Introdução aos Estudos Históricos de Langlois e Seignobos.

O procedimento metodológico em torno das fontes é o da crítica: externa (de procedência, veracidade, de erudição) e interna (hermenêutica). Assim ele incluía também a comparação, a análise sincrônica em relação ao período e, por fim, as deduções a partir dos elementos encontraos para reconstituir os fatos. Para Langlois e Seignobos era necessária ainda uma divisão de trabalho na História. Era preciso que existissem peritos, arquivistas, bibliotecários, jovens pesquisadores com trabalhos monográficos e, em seguida, a síntese deveria ser elaborada por especialistas mais experientes.58

Descrever objetivamente o que verdadeiramente aconteceu – esse é o ponto nevrálgico e também a crítica sobre o realismo epistemológico dos metódicos alemães ou franceses, afinal a complexidade do passado e dos registros existentes não permitem, embora tenha sido uma meta sempre presente a reconstituição do passado em sua plenitude. Rigor do método e exigência da imparcialidade eram vozes correntes, de Ranke a Monod sobre o ofício dos historiadores, bem como o fetichismo sobre a fonte, que seria o sujeito da história e não o objeto de sua seleção e crítica.

A história quantitativa

A Quantificação Histórica começou a ser desenvolvida entre os economistas, desde fins do século XIX, adquirindo forte impulso em 1929 diante do impacto da quebra da bolsa de valores nos Estados Unidos da América e da necessidade de enfrentar os desafios propostos pela crise.59 Nomes destacados no campo são os de John Conrad e John Meyer, que desenvolveram fortemente a denominada cliometria, que recorre às estatísticas a fim de confirmar modelos teóricos dedutivos, bem como os de Robert Fogel, Jonathan Hughes, John Komlos e Douglass North. História econômica e história demográfica foram os campos que mais se fundamentaram no aporte quantitativo.

Recebendo influxos tanto dos avanços da economia, com o aprofundamento das séries e dados estatísticos, quanto da sociologia, a História Quantitativa tornou-se paulatinamente uma referência importante para os estudos históricos. O manuseio de números, estatísticas, fórmulas e equações aproximaram a chamada História Quantitativa de uma compreensão mais científica e objetiva de história60. Além de números, a contabilidade de termos, conceitos e vocábulos também conheceu avanços com a chamada lexicografia. E influenciou enormemente não apenas a história econômica e social anglo-saxã, como a francesa e, também, a brasileira, entre os anos 1940 e 1980. Para muitos, a História Quantitativa poderia conferir maior efetividade à análise do passado. Ao invés das fontes habituais que eram sempre tomadas para uma abordagem qualitativa, a chamada História Serial introduziu nas proximidades dos meados do século XX uma perspectiva inteiramente nova: tratava-se de constituir “séries” de fontes e de abordá-las de acordo com técnicas igualmente inéditas.

Ainda hoje, História Quantitativa e História Serial podem aparecer conectadas, mas é possível perfeitamente pensar trabalhos de História Serial sem a preocupação quantitativa propriamente dita, mas, de todo modo, é preciso distinguir bem uma modalidade da outra. Para entendermos essa diferença, vamos, antes de mais nada, refletir sobre o que é exatamente uma “série” na historiografia.

Na chamada História Serial o historiador estabelece uma “série”, e é esse conjunto de documentos que o interessam, que constituem um corpus específico, recortado por algum tema, período, emissor, etc. Observemos:

François Furet, em seu Atelier do Historiador (1982), define a História Serial em termos da constituição do fato histórico em séries homogêneas e comparáveis. Dito de outra forma, trata-se de “serializar” o fato histórico, para medi-lo em sua repetição e variação através de um período que muitas vezes é o da longa duração. Na verdade a duração longa, ou pelo menos a média duração (relativa às conjunturas), foram as que predominaram [sic] nos primeiros trabalhos de História Serial – muito voltados, nesta primeira época, para a História Econômica e para a História Demográfica, ao mesmo tempo que combinados com a perspectiva de uma História Quantitativa. Todavia, pode-se proceder a uma serialização relacionada também a um período relativamente curto, desde que o conjunto documental estabelecido seja suficientemente denso (BARROS, 2011. v. IV, p. 82).

A História Quantitativa conheceu enorme avanço entre os norte-americanos após a década de 1940 e permitiu construir conjuntos expressivos de informações econômicas, sociais e políticas sobre os mais diferentes objetos. Nesse tipo de História, as fontes e o problema a ser estudado se completam. No primeiro sentido, François Furet fala em termos de uma serialização de fatos históricos que trazem entre si um padrão de repetitividade (fatos históricos que serão obviamente de um novo tipo, não mais se reduzindo aos acontecimentos políticos). No segundo sentido, ao examinar os novos paradigmas historiográficos surgidos no século XX, Michel Foucault assinala que “a história serial define seu objeto a partir de um conjunto de documentos dos quais ela dispõe”.61

O trabalho com as fontes administrativas, estatísticas, testamentárias, policiais ou cartoriais, além dos dados econômicos ou demográficos constituíram a matéria-prima sob a qual se erigiu a História Quantitativa – embora seja possível também converter documentação literária, iconográfica e até mesmo a arte em cifras a serem tabuladas. Vale lembrar que a ênfase sobre o quantitativo propriamente dito não significou, em absoluto, o desprezo pelo qualitativo – uma vez que as análises quantitativas, na maior parte das vezes, destinam-se a perceber tendências, variações ou padrões, integrando o conjunto estudado em realidades históricas mais amplas ou conhecidas.

Conforme logo veremos, a série pode se prestar à percepção do quantitativo, mas também pode se prestar ao entendimento das mudanças qualitativas. Os dados quantitativos são capazes de iluminar muitas realidades políticas, econômicas, sociais e até culturais. Nesse sentido:

Será bastante buscar uma exemplificação final com o próprio estudo pioneiro de Pierre Chaunu. O recorte de sua tese, estabelecido entre 1504 e 1650, é criado a partir de uma primeira data em que a documentação da ‘Casa de Contratação de Sevilha’ lhe permite uma construção estatística [...]. O recorte documental problematizado, enfim, organizou o tempo do historiador (BARROS, 2011. v. IV, p. 85).

História Serial e História Quantitativa são duas abordagens que podem se sobrepor ou caminharem juntas constituindo a História Serial Quantitativa, mas também podem seguir separadas. Para Barros:

A História Serial refere-se ao uso de um determinado tipo de fontes (homogêneas, do mesmo tipo, eferentes a um período coerente com o problema a ser examinado), e que permitam uma determinada forma de tratamento (a serialização de dados, a identificação de elementos ou ocorrências comuns que permitam a identificação de um padrão e, na contrapartida, uma atenção às diferenças, às vezes graduais, para se medir variações). Já a História Quantitativa deve ser definida através de um outro critério: o seu campo de observação. O que a História Quantitativa pretende observar da realidade está atravessado pela noção do “número”, da “quantidade”, de valores a serem medidos (BARROS, 2011. v. IV, p. 92).

O uso de estatísticas, fórmulas e gráficos permitem elaborar generalizações sobre determinados fenômenos históricos, conferindo à História Quantitativa um caráter científico nos moldes das demais ciências do homem, observando variações, padrões, curvas ou mudanças radicais. A quantificação pressupõe a serialização, mas não o inverso. Posso trabalhar com séries de fontes específicas sem fazer nenhum tipo de quantificação ou uso de números.

Um risco que se corre, ao fazer História Quantitativa é o de restringir o trabalho meramente a informações numéricas como se retratassem uma verdade irrefutável, ou como se fossem um espelho do real. Michel de Certeau alerta para o que chama de ilusão quantitativa, bem como relativiza o papel do computador em sua capacidade, praticamente infinita de gerar cálculos ou cifras, estabelecendo percentuais, curvas, etc. Segundo Certeau isso, por si só, não é garantia de conhecimento mais verdadeiro ou mais objetivo, pois mesmo as estatísticas são falhas, ou constroem identidades provisórias que não necessariamente traduzem o real, afinal, se eu bebo um litro de vinho por semana e você nenhum, passamos a beber meio. Como se vê, mesmo a exposição de quantidades exige a problematização feita pelo historiador.62

Como veremos mais adiante, foi no interior da história da Escola dos Annales que a História Quantitativa teve o seu próprio ritmo e as suas próprias balizas cronológicas. Hoje, embora a história serial já não constitua mais o grande paradigma dominante da historiografia francesa, podemos dizer que ela tornou-se parte importante do repertório historiográfico do historiador contemporâneo. Assim, conhecê-la é fundamental para a formação dos historiadores de hoje, independentemente dos caminhos a serem trilhados.

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Filósofo, matemático, historiador, jurista, filólogo, teólogo, o alemão Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716), é um espírito verdadeiramente universal. A filosofia de Leibniz estabelece uma ponte entre a filosofia renascentista e a iluminista, lançando as bases para os grandes sistemas da filosofia contemporânea. [Ver no texto]
44
Basta ver as recomendações de dois autores setecentistas: VOLTAIRE. “História”. In: ______. Dicionário filosófico. São Paulo: Abril Cultural, 1989. (Coleção Os pensadores); CHLADENIUS, J. M. Princípios gerais da ciência histórica. Campinas: Unicamp, 2013. [Ver no texto]
45
DROYSEN, J. G. Manual de teoria da história. Petrópolis: Vozes, 2009; NIEBUHR, B. Römische Geschichte [História Romana]. Berlin: [s. n.], 1811-1812. 2 v. [Ver no texto]
46
Ver, sobretudo a “Introdução” da História Romana, de Niebuhr (1811-1812), e a Historik, de Droysen (1858). [Ver no texto]
47
HUMBOLDT, W. von. A tarefa dos historiadores. In: MARTINS, E. C. R. A história pensada. São Paulo: Contexto, 2010. [Ver no texto]
48
Ver: BERNHEIN, E. Introduccion al estudio de la historia. Barcelona: Labor, 1937. [Ver no texto]
49
HUMBOLDT, W. von. A tarefa dos historiadores. In: MARTINS, E. C. R. A história pensada. São Paulo: Contexto, 2010. [Ver no texto]
50
BENTIVOGLIO, Julio; LOPES, Marcos Antônio (Orgs.). A constituição da história como ciência: de Ranke a Braudel. Petrópolis: Vozes, 2013. [Ver no texto]
51
DROYSEN, J. G. Manual de teoria da história. Petrópolis: Vozes, 2009. [Ver no texto]
52
BENTIVOGLIO, Julio; LOPES, Marcos Antônio (Orgs.). A constituição da história como ciência: de Ranke a Braudel. Petrópolis: Vozes, 2013. [Ver no texto]
53
O positivismo foi fundado na França por Auguste Comte, que redigiu seu Curso de filosofia positiva entre 1830 e 1842, em seis volumes, em que defendia a tese de que a humanidade teria passado por três idades de evolução: teológica, metafísica e positiva. Muitas vezes o positivismo é tomado como uma ideologia nas ciências sociais. [Ver no texto]
54
BOSI, Alfredo. O positivismo no Brasil. In: MOISÉS, Leila P. Do positivismo à desconstrução. São Paulo: Edusp, 2004. [Ver no texto]
55
BOURDÉ, Guy; MARTIN, Hervé. A escola metódica. In: _____. As escolas históricas. Lisboa: Europa-América, 1994. [Ver no texto]
56
Michael Lowy, em Ideologias e ciência social (1984), tem a pachorra de, numa simplificação grosseira, identificar Max Weber ao positivismo. [Ver no texto]
57
LANGLOIS, Charles; SEIGNOBOS, Charles. Introdução aos estudos históricos. São Paulo: Renascença, 1944. [Ver no texto]
58
LANGLOIS, Charles; SEIGNOBOS, Charles. Introdução aos estudos históricos. São Paulo: Renascença, 1944. [Ver no texto]
59
FLORENTINO, Manolo; FRAGOSO, João. A História Econômica: balanço e perspectivas recentes. In: CARDOSO, Ciro Flamarion. Domínios da História: ensaios de teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Campus, 1997. [Ver no texto]
60
Cf. KOMLOS, J.; EDDIE, S. Selected cliometric studies. Stuttgart: Franz Steiner, 1997. [Ver no texto]
61
Cf. BARROS, José D’Assunção. Os campos da história. Petrópolis: Vozes, 2006. [Ver no texto]
62
Cf. CERTEAU, Michel de. A escrita da história. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002. [Ver no texto]
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